um homem apaixonado
por uma mulher feita
gosta de vinho tinto.
domingo, 28 de fevereiro de 2010
quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
A amizade
Na voragem da vida, nas esquinas das emoções, nessas encruzilhadas que se formam no pensamento, perdemos amigos. Mas para sermos mais precisos e aliviarmos o peso da perda, é preciso dizer que não os perdemos verdadeiramente. Um verdadeiro amigo nunca se perde. Quanto muito podemos não o ver, não lhe telefonar, com ele não trocar opiniões. Mas sabemos que ele existe, que ele está lá quando precisarmos dele. Porque se o amigo tiver sido feito com fermento e massa de olhos brilhantes, de abraços, de lágrimas, de palavras suaves, de respeito, de confiança, de compreensão, a amizade sobrevive sempre. Pode estar moribunda, presa em folhas de papel amareladas pelo tempo, enclausurada num grito que não se deu, calada em elogios adiados, enterrada em memórias movediças, pode ter sido esmagada por um conflito que não se soube resolver, enleada em rumores, assombrada por fantasmas que alguém soltou como cães raivosos que nos saíram ao caminho e nos morderam o coração. Mas não está morta. É uma pétala que, basta querer, rasga o cimento da hipocrisia, é um pássaro que com asas de veludo rebenta a gaiola do cinismo, é uma borboleta frágil que destrói o interesse pontual e estratégico. É um sopro de vida, uma tulipa no deserto, uma chama a arder dentro dum cubo de gelo, uma verdade perdida no labirinto da mentira, uma corda para sair do poço, uma almofada fofa sobre um precipício. A amizade é coisa una feita por dois. Cada um pode ter seguido por uma estrada diferente, às vezes até em sentidos opostos, já não se escrevem, já nem ao menos sabem o endereço um do outro, esqueceram a morada, esqueceram o rosto, esqueceram os risos, esqueceram o calor das palavras, esqueceram os cafés, as noites, a poesia, os medos que contavam um ao outro, os sonhos que diziam um ao outro, esqueceram as fraquezas que mostravam um ao outro, a força que davam um ao outro. Já não brindam à saúde de cada um e agora são dois copos partidos, ansiosamente procurando saber de quem é a culpa de se terem transformado em estilhaços.A amizade é humana, e por isso a amizade tem arrufos. A amizade quer a atenção toda. A amizade é de cristal. É uma bola de sabão. A amizade é uma pomba branca zangada. A amizade hiberna. A amizade tem fases de armário. A amizade faz birras. A amizade é uma cigarra teimosa.A amizade, por saber que tem amigos, e que eles a perdoam, esquece-se deles. Mas felizmente, a amizade tem raízes que quando se cansam do vazio retornam sempre à terra que as viu nascer. A amizade é um boomerang. É um vento morno que volta. Um Verão que aquece. Fogo que arde e se vê na cara. A amizade é um pássaro que regressa ao ninho quando tem frio. A amizade nunca morre porque tem dois corações.
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010
domingo, 21 de fevereiro de 2010
quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010
A teia
A vida é uma teia de interesses. O correr dos dias é uma enxurrada de decisões, uma amálgama de emoções que nos fazem agarrar a qualquer coisa para não irmos ao fundo. Tanta dúvida, tanta encruzilhada, tanta opção, tanta inquietação.Para nos mantermos à tona subimos à mais pequena pedra, abraçamo-nos ao vento, pegamos em pontas soltas, deitamo-nos em qualquer colo, deslumbramo-nos com qualquer luz.Temos medo. Todos temos medo de falhar. De desaproveitar a existência, de perder o pé, de ficar para trás, esquecidos, pobres, indiferentes, entorpecidos, pouco mais que números, motivo de gozo, desilusão de pais, vergonha de filhos. Não queremos ficar enterrados em mediania, incapazes de um golpe de asa, entregues à rotina, submissos como cães gordos, dando ao rabo, rosnando em surdina para os donos não nos ouvirem.Não admitimos ficar de fora, não integrar a vanguarda, não sermos reluzentes, crepitantes, interessantes, válidos, modernos, memoráveis.E para darmos conta de tudo isto temos o raciocínio. Ou o instinto de sobrevivência que em situações de aflição são uma e a mesma coisa.Alguns de nós descobrem-se a si mesmos, projectam-se, avaliam-se, buscam horizontes, não têm raiva nas gengivas, lêem, respeitam a diferença, propõem, debatem, sentem ternura, sentem vergonha, calam-se quando o silêncio se levanta, falam sem cinismo, usam as mesmas palavras na cara e nas costas, têm almas de veludo branco, dormem contentes com as suas consciências.E sabem perder porque sabem que perder é apenas um sol-posto. De manhã há mais.E há outros de nós que perderam o equilíbrio, calculam as perdas e os ganhos, as mais valias, os proveitos. Fazem contas, são usurários, maquiavélicos. Toldados pela gula, colam-se como lapas, agarram-se como carraças, ferram o dente e não largam. São os guerrilheiros das nossas ruas, dos nossos cafés, do nosso mundo pequeno e vil.São aranhas numa teia. Esperam por homens bons como quem espera por moscas ingénuas. Para os apanharem desprevenidos e com um sorriso nas suas caras ruins os usarem e os deitarem para o lado, secos e gastos.Para os enlearem, para os prenderem, para os sugarem, para lhes arrancarem as suas asas, para lhes taparem os olhos, as bocas, para lhe roubarem a sua liberdade, os seus sonhos, as ilusões, as palavras bonitas, para os comerem com as suas naturezas más. Para dizerem mal nos seus conluios de aranhas perdidas.Os homens são dicionários de antónimos. Zangados com o seu significado, pouco ou muito ou nenhum, rasgam o papel que os sustenta. Não se admitem. Não se suportam. São vespas furiosas dentro de uma garrafa de vidro. A existência é uma eterna garrafa de vidro fechada. Um espelho imenso que reflecte sombras, terrores e glórias vãs a que só as campas vêm dar descanso.
A vida é uma teia.
Voemos então por cima dela.
Abalemos com os pássaros.
A vida é uma teia.
Voemos então por cima dela.
Abalemos com os pássaros.
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
domingo, 14 de fevereiro de 2010
sábado, 13 de fevereiro de 2010
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010
quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010
Alcançar
Não aceita a ideia de viver um dia de cada vez.É pouco, não suporta a inércia do momento. Nem os ponteiros do relógio, esses escravos do tempo, nela se detêm, quanto mais ele que é uma inquietação pegada! Precisa de se precipitar, antecipar, prever, deduzir. Precisa de esventrar os factos e desejar outra coisa qualquer. Tem sempre outra fome que o presente não mata.(O presente é uma bolacha de água e sal.)Dentro deste homem nada existe. Só existirá. Lá à frente, no futuro, é que ele se encontra. Mas o raio do devir vai montado num caracol e quando lá chega já leva o momento montado no dorso.O homem é um rato numa roda. Planos? Isso é para gente com paciência e agendas de bolso que sabe que o sol também tem de dormir e que há um tempo para as borboletas e outro para as castanhas assadas. Quem espera nunca alcança. Esperar é ter ferrugem na alma. Esperar é entreter-se no caminho. Esperar é estar sentado. Esperar não é mais do que o destino escrito com outras letras. A pressa é muita. Tem medo de não ter tempo. Tem medo de ficar a meio. Mas depois, feita a viagem, nada do que encontra lhe chega quando lá chega. No fundo o que conta é a partida e talvez um bocado do caminho. O resto é chegar lá. E chegar é o fim, é o desejo saciado, a barriga cheia, a tarefa cumprida, o sonho realizado, o compromisso honrado, o processo concluído. Mas para que serve a conclusão?Chegar é apenas estar. Não é ser. Ser é questionar, é duvidar, é não querer estar apenas por estar. Ser é ir à procura de outro estar. Estar é um pássaro sem asas. Não tem coração, tem sim um motor movido a ansiedade dentro do peito.Esperar não é uma virtude. Esperar é uma fraqueza de espírito.Esperar é uma osga parada. Esperar é de vez em quando comer um mosquito. Esperar é uma cana de pesca. Esperar é ocasionalmente apanhar um peixe.Esperar é plantar. Esperar é aguardar pela chegada das couves lombarda.Esperar é uma fila. Esperar é um consultório de médico. Um sinal vermelho. Um atraso. Uma submissão. Uma virgindade até ao casamento. Uma carta que não chega. Um beijo adiado. Um sono que não vem. Uma hora que ainda falta. Esperar é às vezes já não haver lugar.Quer alcançar quando quer e lhe apetece. E não há realidade que o detenha, nem razão que o pare. Apenas o tempo se lhe põe à frente. Apenas o tempo é capaz de o guerrear. É aliás a única entidade que o tenta prender. Mas o homem disfarça-se de poesia e loucura para enganar o tempo. Tem frio no Verão, uiva no quarto minguante, nada nos desertos, rasteja no céu, põe fogo na febre, colhe maçãs em Novembro, adianta os relógios de todas as torres. Não admite que tempo é uma escada que se sobe degrau a degrau, pé ante pé, dia após dia. E escolhe subir o futuro por uma corda, rasgar as mãos, perder a cor do cabelo para chegar primeiro e envelhecer antes de tempo. Este desassossego é tempo perdido, pois o tempo é pastor de um rebanho quieto e o relógio é o seu cão.
Texto publicado no jornal Correioalentejo.
Texto publicado no jornal Correioalentejo.
terça-feira, 9 de fevereiro de 2010
domingo, 7 de fevereiro de 2010
sombra de penas
passas pela minha vida
rasando o meu entardecer
e sobre o crepúsculo vais deixando
um vestígio de asas libertas,
uma sombra de penas,
um eco de luz castanha.
que te hei-de eu dizer de mim
se os pássaros têm olhos perfeitos
quando voam?
rasando o meu entardecer
e sobre o crepúsculo vais deixando
um vestígio de asas libertas,
uma sombra de penas,
um eco de luz castanha.
que te hei-de eu dizer de mim
se os pássaros têm olhos perfeitos
quando voam?
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